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Fazenda no Paiaguás mantinha trabalhadores rurais em condições análogas à escravidão
Operação envolvendo autoridades federais e estaduais identificou a situação em propriedade de 15 mil hectares
CORREIO DO ESTADO / RODOLFO CÉSAR
A cerca de 180 km de Corumbá, operação conjunta entre Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério do Trabalho e Emprego, Polícia Militar do Mato Grosso do Sul e Polícia do Ministério Público da União identificou que cinco trabalhadores rurais viviam em barracos para atuar na lida do gado.
Com jornada exaustiva, trabalho forçado, condição degradante do trabalho, servidão por dívida, cerceamento do uso de meio de transporte e vigilância ostensiva. A identificação desses fatores representou em caracterização de trabalho análogo à escravidão.
Para conseguir realizar o flagrante e resgatar os trabalhadores da região, a operação durou entre 12 e 17 de março.
A Polícia Federal divulgou detalhes da ação na manhã desta quinta-feira (23), depois da tramitação na Justiça do Trabalho de penalizações contra o proprietário da fazenda.
Por conta das irregularidades identificadas, houve penalização com indenização trabalhista no valor de R$ 37.476,70, além de pagamento de dano moral individual de R$ 240.195,00, a ser dividido entre os cinco trabalhadores; e pagamento de dano moral coletivo de R$ 240 mil, a ser pago em três parcelas, a partir de 15 de abril. Esse valor do dano coletivo vai ser repassado para entidades.
A multa de dano moral individual foi fixada a partir do cálculo de 20 vezes o valor do salário acordado entre o empregador e os trabalhadores rurais.
“O grupo de trabalhadores, todos residentes em Corumbá, foi contratado de maneira informal, sendo alojado em barracos construídos com paus, arbustos e cobertos com lona plástica, expostos a intempéries e animais silvestres e peçonhentos. Para dormir, os trabalhadores improvisaram tarimbas – estruturas montadas com varas de arbustos - e redes. O empregador também não fornecia água, nem potável nem para banho. Para este fim, os trabalhadores usavam um galão plástico cortado para higiene, sem qualquer privacidade”, detalhou a Polícia Federal, em nota.
Depois que os trabalhadores foram ouvidos, alguns deles pontuaram para as autoridades que o gosto da água que consumiam era de ferrugem.
“A condição de trabalho análogo à escravidão foi configurada devido as seguintes características: trabalho forçado, jornada exaustiva, condição degradante do trabalho, servidão por dívida, cerceamento do uso de qualquer meio de transporte, e vigilância ostensiva no local de trabalho”, identificou a PF.
As denúncias que as autoridades receberam também apontaram para uma situação semelhante na região do Paraguai-mirim, a cerca de 60 km de Corumbá.
Houve vistoria neste local e foram encontrados vestígios de moradia precária, mas os trabalhadores não foram localizados. Como não houve flagrante do crime, o caso foi encerrado.
Nessa região onde ocorreu a fiscalização, no Paraguai-mirim, a Polícia Federal, fiscais do Ibama e da Agência Nacional de Mineração (ANM) identificaram no começo de março suspeita de grilagem de terra e exploração ilegal de minério. Um trabalhador chegou a ser encontrado.
Ele vivia em barraco e foi levado para Corumbá depois da fiscalização para verificar mineração ilegal. O posseiro que atuava na propriedade tinha desmatado uma área e construído uma estrada.
Como essas áreas são de difícil acesso, as autoridades policiais e os fiscais precisaram do apoio de helicóptero da Casa Militar do Governo do Estado de Mato Grosso do Sul e de embarcação do Grupo Especial de Polícia Marítima da Polícia Federal de Corumbá.
Conforme a PF em Corumbá, denúncias anônimas sobre esse tipo de abuso ligado a trabalho análogo à escravidão podem ser feitas pelo e-mail [email protected] e pelo telefone 67 9 9202 8240.
Casos de flagrante de trabalho análogo à escravidão em Mato Grosso do Sul cresceram mais de 88% entre 2019 e 2021, conforme dados do Ministério Público do Trabalho de Mato Grosso do Sul (MPT-MS).
As condições desfavoráveis aconteceram em diferentes setores e, até agora, foram identificadas em 13 municípios: Aquidauana, Bela Vista, Caracol, Itaquiraí, Campo Grande, Anastácio, Antônio João, Corumbá, Ponta Porã, Porto Murtinho, Rochedo, Nioaque e Sidrolândia.
Dentro da série de dados de 2019 a 2021, Porto Murtinho foi o município que teve registros feitos pelo MPT em todos os anos. Algumas vezes, figurando com o maior registro de trabalho análogo à escravidão.
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