• Sábado, 18 de Outubro de 2025

Conheça o ex-Grêmio que fundou clube por sonho de jogar na cidade natal

Ex-jogador Adriano Strack criou o Clube 1992, que disputou a primeira partida profissional na terceira divisão gaúcha. Na Bósnia, Strack chegou a ser cobrado por dar caneta

GLOBOESPORTE.COM / ALANA SCHNEIDER


Adriano Strack na estreia do Clube 1992 em uma competição profissional — Foto: Arquivo Pessoal/Adriano Strack

Imagine fundar um clube, ser um dos treinadores e disputar a primeira partida da equipe em uma competição profissional dentro de campo. Foi o que aconteceu com o ex-jogador Adriano Strack, dispensado de clube na Bósnia por dar duas canetas em um treino. Na estreia do 1992 pelo Gauchão Série B, a terceira divisão gaúcha, ele entrou em campo em um time formado por atletas da base. Coube ao dono do clube a missão de marcar os gols.

– A gente tem muito problema de finalização, os meninos jogam muita bola, mas, às vezes acabam não tendo aquela potência de chutar para o gol. Então eu jogo mais para finalizar as jogadas, né? – explicou o (ex) atleta de 33 anos, que pendurou as chuteiras em 2016.

Adriano passou pela base do Grêmio e atuou profissionalmente por Juventude, Chapecoense e clubes europeus. No entanto, nunca disputou uma partida na cidade natal de Carazinho, localizada no noroeste gaúcho. Realizou o sonho neste mês, vestindo a camisa do próprio clube, no empate em 0 a 0 com o Nova Prata, na segunda rodada do estadual.

– É bacana porque a cidade nunca me viu jogar, né? Eu saí muito cedo de casa, então, na estreia, quando eu coloquei a camisa, até a minha mulher falou, "nossa, parecia o Neymar entrando em campo, todo mundo queria ver jogar". Virou uma atração – brincou.

O sonho de ter um clube

O sonho de criar o próprio clube surgiu da insatisfação de Adriano com a carreira de jogador. Enquanto jogava na Bósnia-Herzegovina, começou a fazer os primeiros rascunhos do logo e da infraestrutura do clube que desejava fundar, mas as ideias só saíram do papel em 2016.

– Quando eu fui para Bósnia, aos 21 anos, comprei um caderno para aprender a falar inglês e bósnio. E nesse caderno eu desenhei o clube, o estádio e até as placas de publicidade. Só que eu ainda não sabia que seria o 1992. No meu pensamento era para ser o Atlético Carazinho, um clube da minha cidade que estava abandonado e que era federado na Federação Gaúcha e na CBF – explicou.

Adriano não conseguiu adquirir o clube da cidade por entraves políticos e acabou por comprar o União Harmonia, de Canoas, que desde 2024, dá nome ao Clube 1992, de Carazinho. A agremiação conta com uma sede social que inclui academia, sauna, piscina, quadras society e de areia, além da estrutura de futebol.

– A gente montou primeiro toda a estrutura social em 2018 para trazer associados que ajudam a pagar a conta. No ano passado é que eu comecei a investir pesado no futebol e fui realmente para o meu sonho, pois já tinha uma estrutura para me sustentar. Comecei a trazer jogadores de fora e agora a gente está conquistando o selo de clube formador de atletas, já protocolamos na Federação Gaúcha e na CBF e só estamos aguardando a vistoria – detalhou Adriano.

Atualmente, o projeto atende cerca de 300 jovens do Sub-7 ao Sub-17, dos quais 40 residem nos alojamentos do clube. O projeto dispõe de salas onde são ministradas aulas de oratória, de inglês e de comportamento dentro de campo.

– A carreira de um atleta é muita curta, de no máximo 12 anos num alto nível. Então, a gente tem que trabalhar também a questão humana desses meninos. Coisas que eu não tive na minha carreira trabalho para oferecer a eles.

Dentro do clube que criou, Adriano acumula funções administrativas e ainda treina a equipe sub-17. Ele conta com a parceria de um sócio, que é o atual presidente da agremiação.

Adriano usa os erros da carreira como lição dentro e fora dos gramados e admite que faltou planejamento como jogador e que a vida "andarilha" entre clubes dificultou chegar ao alto nível. Mas não se arrepende e se vê mais feliz no trabalho com os jovens atletas.

– Acredito que estou mais feliz hoje, porque o nosso sonho acaba se incorporando a de outros atletas e a gente acaba ajudando a formá-los e a tomarem melhores decisões.

Escudo com inspiração da Bósnia

Como jogador, Adriano guarda com carinho a passagem pelo NK Travnik, clube da primeira divisão da Bósnia-Herzegovina, onde foi artilheiro e evitou o rebaixamento da equipe em 2014.

A passagem marcante pelos Bálcãs ficou gravado no escudo do Clube 1992, criado com base nos traços da equipe Veziri. Já o nome, tem inspiração alemã, mas origem 100% gaúcha.

– Quando eu estava fora do país, tive uma passagem rápida por Munique e lá tem um clube que se chama 1860. E eu via que o pessoal apelidava de 60, algo bem legal. E aquilo ficou batendo na minha cabeça, no Brasil não tem nenhum clube que se chama um ano. Existe 15 de novembro, XV de Piracicaba, Sete de setembro, mas não existe um clube chamado um ano. E aí decidi colocar o ano que eu nasci, 1992, que vai ser carinhosamente apelidado de 92 – contou.

– O símbolo eu misturei o do NK Travnik com o símbolo da Alemanha, tem até os risquinhos embaixo do nosso logo e tudo mais.

Jogo sério, nada de circo

A temporada no futebol bósnio rendeu a Adriano outra história curiosa. O gaúcho foi dispensado no terceiro dia de clube, após dar duas canetas em um treino. Chamado pela esposa do presidente, que falava espanhol, foi exigido de Adriano jogar com mais seriedade.

– Eu achando que eu estava jogando muito e ela fala que eu era muito circo e que eles não gostavam do Neymar. Na época, ele estava muito estourado e eles não gostavam de jogo assim, com chapéu, caneta. E aí eles me apelidaram de circo e eu entendi o recado– revelou.

Adriano mudou a postura e se adaptou ao jogo mais físico e de força. Sem demora, foi readmitido e assinou o contrato profissional e foi um dos únicos brasileiros a se manter na equipe.

– Eu comecei a jogar de verdade, baixar a ripa como se fala aqui no Rio Grande do Sul. É bem delicado o brasileiro jogar lá, até por causa da língua. E eu consegui.

O que esperar do 1992

A partir da estreia na Terceira Divisão Gaúcha, o 1992 traça novas metas. O clube deu o primeiro passo na construção de um estádio próprio – hoje, manda os jogos no campo do Glória de Carazinho – e busca encerrar a temporada com a classificação à Divisão de Acesso do estadual.

– A gente está muito focado nessa questão de formar os atletas, mas a gente sonha muito com o clube subindo. Claro que temos os pés no chão, mas no máximo aí, em dois, três anos, já projetar um gauchão. Então, o estádio está vindo, recém fizemos a terraplanagem, as coisas estão acontecendo e o profissional tem que acompanhar esse processo – afirmou.

O próximo compromisso do Clube 1992 será domingo, às 15h, diante do Novo Horizonte, em Carazinho, pela quarta rodada do estadual. A equipe é a 4ª colocada do Grupo A com um ponto.



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