• Sexta, 04 de Outubro de 2024

Seminário Estadual de Teatro traz conversas e espetáculos à Capital

Abertura do Seminário Estadual de Teatro, na manhã de ontem, no Espaço Fulano di Tal, deu partida à mostra Boca de Cena 2023, que segue até sábado com espetáculos gratuitos e outras atividades

CORREIO DO ESTADO / MARCOS PIERRY


Alessandra Tavares, de Amambai: 'Levar 'Donzela', que é um texto extremamente forte, para Campo Grande e para vários municípios é muito importante, porque por meio da arte a gente pode também tentar mudar esse porcentual tão trágico' - Fotos: Ricardo Gome

É conversando que a gente se entende e tem a chance de promover um circuito de artes cênicas mais forte, à altura da potência que Mato Grosso do Sul sempre demonstrou possuir.

Foi mais ou menos assim, com fé nas artes do espetáculo e na capacidade dos artistas do Estado de fazerem bonito em cena, que começou ontem, pela manhã, o Seminário Estadual de Teatro e Circo. 

A primeira agenda do seminário, no Espaço Fulano di Tal, foi uma espécie de roda de conversa para marcar – e de modo estratégico – o Dia Mundial do Teatro e do Circo.

O papo reuniu profissionais que atuam em diferentes regiões do Estado, com diversas linguagens, desde a dança contemporânea ao teatro dramático, digamos, mais tradicional, possibilitando, além de reencontros e novas aproximações, a troca de ideias e o esboço de uma pauta de reivindicações, a ser consolidada até amanhã, quando se encerra o seminário, que será encaminhada ao poder público.

A abertura do evento, na sede do Fulano di Tal (Rua Rui Barbosa, nº 3.099, Centro), foi também a primeira atividade da mostra Boca de Cena 2023 – Semana do Teatro e do Circo de MS, que volta a ser realizada pela Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul (FCMS), com dezenas de espetáculos e outras atividades com acesso gratuito, em vários pontos de Campo Grande, até sábado.

“É uma semana comemorativa, em que congregamos espetáculos de companhias de teatro e de circo de várias vertentes e linguagens em uma grande festa que será oferecida para o público, por meio de 38 apresentações artísticas gratuitas e mais algumas atividades, como o Seminário Estadual de Teatro e as oficinas”, declarou Marcio Veiga, gerente de Difusão Cultural da FCMS, durante a abertura do seminário.

“E nós teremos ainda debates e discussões para possibilitar que esta semana seja também um espaço aberto para discussão sobre as políticas públicas para o teatro e o circo aqui no Estado”, destacou Veiga.

O último Boca de Cena organizado pela FCMS foi em 2018. No ano passado, com organização e produção totalmente a cargo dos próprios artistas e financiamento do governo do Estado, responsável pela FCMS, a mostra voltou a ser realizada em uma versão menor.

Os colegiados setoriais de teatro e de circo também estão com “participação ativa” na edição deste ano.

O Boca de Cena abre tradicionalmente o Seminário Estadual de Teatro e Circo.

“Esse espaço de discussão é uma assembleia livre para que os artistas, produtores e gestores de cultura de outros municípios possam discutir propostas para o governo, para que o governo possa apreciar e executar algumas ações que são anseios da própria classe”, frisou o gerente da FCMS.

“É um espaço organizado de forma horizontal, onde todos têm direito à fala e discutem sobre todas as perspectivas e expectativas com relação ao fazer teatral, à acessibilidade, à democratização do teatro e do circo, e ao fim do seminário é feito um documento, uma carta que é oferecida ao governo do Estado para implementar algumas políticas que foram discutidas”, detalhou Veiga.

CONTRA A BARBÁRIE

Antes da conversa da manhã de ontem, a atriz Alessandra Tavares apresentou “Donzela”, montagem solo que trata de violência doméstica, psicológica e física.

“Por si só, o fato de ser hoje o Dia do Teatro, o Dia do Circo, de a gente estar aqui discutindo as políticas públicas para o nosso estado, já é importante. Então imagina para mim, como atriz, estar aqui fazendo a abertura e ainda mais falar de um tema que é tão importante e necessário, que é a violência contra a mulher, o feminicídio”, afirmou a intérprete.

“Mato Grosso do Sul e Roraima são os dois estados do Brasil com o maior índice de violência doméstica, de feminicídio, a cada seis horas é uma morte. Então, poder levar ‘Donzela’, que é um texto extremamente forte, para Campo Grande e também para vários municípios do Estado é muito importante, porque por meio da arte a gente pode também tentar mudar esse porcentual tão trágico”, avaliou a atriz de Amambai.

PÓS-PANDEMIA

O bailarino Marcelo Mariano, que há 38 anos atua na área da dança em Coxim, levou ao seminário uma reflexão sobre o que os artistas passaram durante a pandemia antes de retomar seus trabalhos.

“Há muito tempo a gente está ilhado por toda essa coisa que aconteceu, com pandemia e tudo. E quais são os anseios? O que é que é o agora? Eu acho muito importante este recomeço, porque agora a gente pode ver o que cada um de nós passou, quais são os objetivos, o que a gente pode construir mais. Porque a gente ficou em frangalhos, principalmente os artistas. Chegou um momento em que a gente não entendia mais quem éramos nós”, elucubrou.

“E acho este momento [do seminário] muito legal. Principalmente pela região norte [de MS], onde está muito fragilizado lá, porque antigamente tinha um movimento muito grande, tinha a Festa do Peixe, grupos de teatro e de dança, milhões de outras coisas, e tudo foi se derretendo. E é isso que a gente quer: voltar com isso, ver essa coisa do coletivo, porque nós aqui de MS temos sim que voltar com esse coletivo, a gente trazer, ouvir e, a partir daí, criar as nossas metas”, apostou Mariano.

SEM AVANÇO

Bianca Machado, da Companhia de Teatro Maria Mole, de Corumbá, disse que o primeiro dia do seminário foi para rememorar.

“Tanto que tem uns papéis aqui mostrando desde 2014 um pouco da nossa lembrança. Nós vamos acabar descobrindo que nós estamos debatendo uma mesma, ou três, quatro, cinco pautas há anos, e que a gente tem avançado pouco. Então é por isso que a gente tem que, primeiro, agora, rememorar os últimos seminários, para ver o que a gente avançou e o que a gente não avançou. Porque, na verdade, nós avançamos pouco. Essa é a realidade”, constatou.

“Aonde está o problema? Esse primeiro momento vai ser de avaliação e de encontro mesmo. E depois da pandemia, agora é a primeira vez que a gente reencontra todo mundo. O seminário é muito importante por causa desse reencontro. Eu consigo ver o trabalho das outras pessoas”, afirmou Bianca, que considera o seminário “fundamental”.

“Acho que a gente tem que tirar daqui a obrigatoriedade de o Estado manter o Boca de Cena, um evento para estar dentro do cronograma do Estado, como acontece com o Festival América do Sul Pantanal, o de Bonito, como estão querendo fazer o Campão Cultural. Que o Boca de Cena possa ser uma coisa permanente. E ainda poderia ser o Boca de Cena que rodasse o Estado, que acontecesse no Estado inteiro”, propôs a artista da Cidade Branca.

PARA SEMPRE

Marcílio Caetano, de Nova Andradina, faz um trabalho no município e no distrito de Casa Verde, ambos, segundo ele, carentes de ofertas culturais.

“O trabalho do sarau cultural tem dado muito certo, tanto que estou lá há mais de 15 anos. A grande discussão que eu tenho trazido é a carência dos municípios com cultura. Bacana ter o Estado, a Fundação de Cultura voltando. Quanto mais a gente puder formatar isso aqui, é muito bom, mas poder levar isso para os municípios é melhor ainda, porque a gente vê a necessidade dos municípios e entende a carência, muitas vezes, até do próprio gestor, que não tem essa visão da cultura”, detalhou Caetano.

“Então, se a gente tem isso aqui no Estado e tem essa possibilidade de levar isso para os municípios, é muito bom. Que bom que passou a pandemia, que a gente está retornando. Acho que o Boca de Cena é maravilhoso, porque traz essa questão artística dos municípios, que tem municípios fazendo essa formatação cultural, trazer esses artistas para o evento fortalece isso. E que isso possa não parar mais”, convocou o representante de Nova Andradina.

Toda a programação do Boca de Cena 2023 é gratuita. Confira em: fundacaodecultura.ms.gov.br/bocadecena/.

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